sepulteiro

06/03/2012

Anel de brilhante, dinheiro no bolso, cinzas às cinzas, todos caímos. Quando escavar minha cova, senhor sepulteiro, deixa-a rasa por favor que eu quero sentir a chuva.

ilesos

02/03/2012

“Eu tenho quatro anos e carrego ainda lembranças vívidas do interior do útero de minha mãe quando, certo dia, debaixo da mesa da cozinha, vestindo uma fantasia [eu acho que é uma fantasia] de caubói, percebo que os azulejos do chão têm medidas praticamente idênticas, mas que aquele não é, não pode ser, o único modo de se disporem azulejos. Percebo que meus carrinhos de brinquedo sobre os tacos de madeira da sala não são idênticos, mas têm em comum o fato de não serem, nenhum deles propriamente um carro de verdade, são sintéticos, demais. Nesse dia, muito seriamente porque eu sou um menino muito sério, concluo que não há rumo ileso”.

02/03/2012

Indigesta esta foto, difícil de entender, a sombra causa um efeito estranhíssimo, parece um pau monstruoso e meio-mole. Não estou certa se é bela. Mas sim estranha e desnecessária. Tive gastura, fiquei com preguiça de você. O corpo nu tem para mim um mistério a ser revelado em situações apenas transcendentais ou quase isso. Devo ser retrógrada demais para discutir isto contigo.

branca

01/03/2012

São Paulo, dia primeiro de março de 2012, apesar de não parecer é madrugada nesta foto. O recurso que usei para captar a cor branca das três figuras terminou por tirar ao céu seu negrume. Mas isso pouco importa. Trata-se simplesmente de três figuras até então inteiras que se liquefazem quando meto os olhos no visor para sacar-lhes a foto. O que se encontra registrado aqui é o deslocamento da cor parede abaixo, escorrendo rumo ao chão. Sozinho, meio bêbado, de madrugada, meu estupor foi tamanho que demorei alguns segundos para tirar a foto antes que as três liquescessem por completo. Na foto seguinte elas já não estão, as paredes negras, o chão encharcado de tinta branca.

é

01/03/2012

Uma impressão agoniada. Algo como o semblante de um homem que busca de alguma maneira compreender ainda que momentaneamente o jeito de uma mulher ou o funcionamento de algo que ele acaba de conhecer e portanto desconhece. Ele se pergunta por que as coisas têm de ser assim, olha para o lado, admite que não haja resposta porque a pergunta é ruim ainda que inevitável e enquanto isso você lhe desenha o corpo suspenso torto. Você o concebe e se pergunta se aquele homem teria tudo o que merece ou se por alguma razão ele jamais terá sido quem é.